sábado, 19 de abril de 2008

Padre Guimarães Neto e a poesia de inspiração divina




WILLIAMS VICENTE




Manoel Vieira Guimarães Neto, ou Padre Guimarães Neto, ou Ir. Manoel (nome com o qual ele atualmente é conhecido no Mosteiro), é um homem de jovialidade impressionante e de capacidade de transmitir a paz em suas palavras de maneira que faz qualquer pessoa crer na predestinação. "Minha mãe conta que quando grávida uma comadre dela passou lá por casa e o padre Francisco passava pela cidade, dando a bênção às mães grávidas. Essa comadre convidou e quando o padre pronunciou a fórmula da bênção sobre a cabeça dela, ela fez uma prece a Deus oferecendo aquela criança e nesse momento eu estremeci em sua barriga", conta.
Em meados deste ano, dia 7 de junho precisamente, Padre Guimarães completará 27 anos de vida dedicados ao sacerdócio. À frente da Paróquia de São Manoel na maior parte do tempo em que se dedicou diretamente ao cotidiano da Igreja, hoje ele deixou de ser padre diocesano para seguir um chamado inadiável. "Ninguém se faz monge sozinho. Pra gente viver e transmitir, a gente tem que receber a tradição monástica".
Por isso, Padre Guimarães faz atualmente o Noviciado em Ponta Grossa, no Paraná, onde recebe a tradição beneditina. Junto a um noviço pernambucano e outro natalense, em março de 2009 Padre Guimarães estará de volta à terra da resistência para erguer os pilares do primeiro mosteiro masculino de Mossoró, o Mosteiro Beneditino que será dedicado à Santíssima Trindade. A festa da Santíssima Trindade, aliás, acontecerá no ano que vem, no dia 7 de junho, mesma data em que o Padre Guimarães completará 28 anos de sacerdócio.
"Eu não deixei nem a igreja, nem de celebrar a missa. Há uma diferença entre padre religioso e padre diocesano. Eu agora, como padre religioso, estou ligado a uma Ordem, no meu caso, a Ordem de São Bento. Ainda mantenho vínculo com a Diocese, mas estou nessa fase de transição. Também devo obediência a meu abade em Ponta Grossa. Mas desde criança sonho em ser monge. Sempre achei que era um sonho quase impossível e que eu teria que me contentar em ser padre diocesano. Até que em 2001 fiz um retiro espiritual, os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola, na serra de Baturité - CE. Terminado o retiro, eu descobri que era feliz como padre diocesano, mas me faltavam duas coisas: vida de silêncio e Oração Comunitária".
O trabalho dedicado à Paróquia é perceptível através das missas, dos trabalhos sociais desenvolvidos pelas pastorais e pouca gente se dá conta que a vida num Mosteiro não significa o abandono das preocupações com as mazelas do planeta. Lá, a contemplação absoluta do divino tem tanta força quanto qualquer ação material em prol da preservação e salvação da humanidade. Para Padre Guimarães, a força da oração pode mover o mundo.
"Tem gente que acha que não tem mais sentido, mas pelo contrário. Já anunciaram não sei quantas vezes a morte de Deus e a gente vê o contrário, o ser humano cada vez mais se volta para Ele. A contribuição mais revolucionaria para o bem da humanidade é através da oração. A própria ciência já se curva, reconhecendo que os pacientes que têm fé se recuperam mais rapidamente. Então, creio que com um mosteiro como esse em Mossoró, as pessoas vão ter consciência que em um determinado lugar da cidade um grupo de homens estará reunido para rezar pelo menos sete vezes por dia comunitariamente. Quanto mais oração, melhor. Como padre diocesano dei minha contribuição à paróquia, agora acho que chegou o momento de dar outro tipo de contribuição, anônima. Quando me levanto às 4 horas da manha lá em Ponta Grossa e circulo pelos corredores do mosteiro, me dou conta de que hoje eu contribua talvez mais do que antes para o bem da humanidade."
A contribuição de Padre Guimarães, no entanto, vai além dos frutos da oração. As ligações com São Bento dão margem para entender outro dom. Padre Guimarães acredita que se atreve a andar pela trilha da escrita, mas o movimento que ele causou na cultura local e as palavras que registram sua experiência através da poesia provam que não se trata de atrevimento. Padre Guimarães é também artista por natureza.
"Não fui eu que escolhi São Bento, foi ele que me escolheu. Passei um tempo no Rio de Janeiro fazendo teatro e quando a carreira estava deslanchando, resolvi voltar pro seminário e essa volta se deu no Mosteiro de São Bento. Na época não percebia, mas hoje vejo como ele esteve presente na minha vida. Quando senti esse desejo mais forte de ser monge, o Mosteiro que decidi fundar foi inspirado na Regra de São Bento. Sempre fui beneditino. O valor que São Bento dá a arte, a contribuição dos mosteiros para a cultura do mundo ocidental foi fundamental, o monges sempre recuperam obras de arte antiqüíssimas... São Bento na própria Regra pede uma atenção especial aos artistas. Agora no mosteiro voltei a desenhar, escrever...coisas que eu não tinha tempo de fazer".
Desse amor pela arte nasceram peças que marcaram os teatros mossoroenses desde 1966, quando ainda estava no seminário ao lado do padre Alfredo Simoneti, no seminário Santa Teresinha, época em que entrou nesse universo como ator no texto de Millôr Fernandes, chamado "Do tamanho do defunto". A partir daí começou a escrever peças baseadas em textos de cunho social, como a adaptação da “Encíclica Populorum Progressio”, de Paulo VI, ou a partir de um comentário de uma vizinha, em 1991, de que na época da ditadura era melhor para viver ("Nunca mais"). Publicou "Chico", um musical sobre São Francisco, posteriormente gravou um CD intitulado "Sedução" que reúne hinos sacros, composições para outras peças e mais canções desenhadas pelo samba. Além de uma comédia inspirada nos velórios, que escreveu e dirigiu em 2005. " 'Vai com Deus' , trata de um tema sério que é a morte, mas juntei vários fatos que aconteceram em velórios aqui em Mossoró e transformei num texto engraçado. Morreu um rapaz que era cozinheiro e a amiga dele convidou todos os amigos para que trouxessem cachaça, salgadinhos, e o velório se transformou numa festa. Teve outro velório onde um homem chegou chorando alto, e ninguém o conhecia. A família do morto foi perguntar por que aquilo e ele disse que naquele dia tinha sido demitido, a mulher tinha fugido com o melhor amigo dele, e ele foi pegar o carro e o filho tinha acabado de bater, então, ele disse que ali era o melhor lugar para ele desabafar naquele dia". Destacam-se ainda "Que bom que você veio", "O santo da Paciência", "O palhaço perdeu a alegria", esta inclusive traduzida para línguas como o espanhol, italiano e luxemburguês.
Antes disso, aos 9 anos, Padre Guimarães ganhou um concurso de calouros na rádio Difusora. Costumava desenhar ainda criança "o padre Huberto de braços abertos. Ele me perguntava por que de braços abertos e eu respondia que era o retrato dele fazendo sermão".
Longe de Mossoró, mas não espiritualmente, enquanto não retorna do noviciado para fundar o Mosteiro da Santíssima Trindade, Ir. Manoel decidiu manter contato com a cidade através de suas poesias publicadas aos domingos neste caderno.
"É uma maneira que encontrei de fazer com que o povo de Mossoró conheça a experiência de um Mosteiro e acompanhe pouco a pouco todo esse período de formação e preparação".

Um comentário:

Unknown disse...

saudades desse querido amigo.